Um músico amigo meu certa vez disse que um grande compositor é aquele que consegue agradar desde o mais erudito fã de música até o indivíduo que não tem nenhum conhecimento musical. Como exemplo ele citou Tom Jobim, falando que praticamente todos conhecem e apreciam suas composições. Uma prova disso é que, durante uma tarde em que estudava, meu amigo ouviu sua empregada cantando distraidamente “Garota de Ipanema”.
Se Tom Jobim conseguiu isso na música, Quentin Tarantino o fez no cinema. Uma prova desse fato é Inglourious Basterds: o cineasta conseguiu agradar desde o mais “erudito” cinéfilo, até o mais simples acompanhante da cena mainstream da sétima arte.
Tarantino faz parte dos "Cineastas do VCR”, uma geração de cineastas que não frequentou faculdades e que teve como escola a cinefilia. Outro profissional do cinema que faz parte desse grupo é Paul Thomas Anderson, amigo do diretor. Quentin afirmou que, se Inglourious Basterds foi um grande filme, em parte, é por culpa de There will be blood – último filme de p.t.a -, pois a qualidade dessa obra é um insentivo para ele realizar uma película à altura.
No entanto, assim como há quem não goste de Tom Jobim – não por falta de conhecimento, mas apenas por uma questão de gosto –, há quem não goste de Tarantino. Minha relação com o diretor beira o antagonismo. Ora amo seus filmes, ora eles não me agradam. Não diria que desgosto dele, pois sou fã de Pulp Fiction, me apaixonei por Inglourious Basterds e gostei muito de Reservoir Dogs. Apesar disso, não diria que ele é um dos meus diretores prediletos, pois Kill Bill e Jackie Brown não me agradaram.
O novo filme do diretor é uma singular releitura da Segunda Guerra Mundial na qual ele colocou todos os elementos característicos presentes em sua filmografia: o rítmo ágil do filme manifesta-se em várias cenas, como na cena da taverna – uma seqüência genial, na qual, em poucos segundos (literalmente), o rumo da cena é totalmente deslocado; os diálogos ousados e elaborados nos divertem e nos atraem em takes que, apesar de longos, não nos cansam em momento algum; e as referências a cultura pop aproximam o espectador do conflito reinventado por Quentin.
Duas atuações em Inglourious Basterds são dignas de destaque. Brad Pitt está muito bom no papel de Aldo Raine, entretanto, ele é ofuscado por Christoph Waltz, ganhador do prêmio de melhor ator no Festival de Cannes. Christoph está genial no papel de Hans Landa, o coronel que é conhecido pelo apelido “The Jew Hunter” (o caçador de judeus). O educado e excêntrico poliglota é responsável por cenas inesquecíveis.
Outra qualidade de Inglourious Basterds é o modo com o qual a obra transforma pequenas ações em atos imponentes, como na cena em que Shosanna (Mélanie Laurent) prepara o projetor para sabotar a grande estréia do filme "Orgulho da nação". Tarantino fez cada simples movimento realizado pela atriz parecer grandioso. Alguém poderia dizer que isso ocorre apenas devido ao encadeamento de idéias, pois aqueles feitos seriam cruciais para o destino da guerra; no entanto, o que torna a cena tensa é muito mais do que o contexto, é a maneira com a qual a cena foi feita e filmada. Quentin consegue deixar o espectador completamente tenso com um simples puxar de alavanca.
Tarantino se redimiu com Inglourious Basterds, pois, desde Pulp Fiction, o cineasta não realizava nada REALMENTE bom. O seu último longa é excelente e muito divertido. Essa é a obra-prima de Quentin, como o diretor dá a entender na cena final com a fala de Brad Pitt “I think this is my masterpiece”. Não lembro de ter me empolgado tanto com a película de 1994.