8 it was RED: Alice no lamentável país das maravilhas

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Alice no lamentável país das maravilhas

Alice no País das Maravilhas (Alice in Wonderland, 2010)

Direção: Tim Burton

Roteiro: Linda Woolverton, Lewis Carroll


Aviso: contém spoilers desse lamentável filme


Patético. A releitura timburtoniana de Alice no País das Maravilhas e Alice no País dos Espelhos (afinal, Tim Burton’s Alice in Wonderland não é uma reprodução cinematográfica de nenhum dos dois títulos) foi extremamente aguardada. Comentava-se ela na internet, na TV – houve uma matéria no Fantástico sobre o filme –, nas revistas, jornais, rádios, enfim, em todas as mídias. Assim, antes mesmo de sua estréia, a película já tinha virado febre, chegando a influenciar a moda. Após seu lançamento, todas as bocas que gritavam notícias sobre a obra se calaram. Estranhei o nítido contraste entre sua espera e sua estréia e, a fim de ver o porquê do brusco silêncio, dirigi-me ao cinema.


Tim Burton

O filme começa com cenas piegas, na qual o pai de Alice mostra seu doce amor a sua meiguíssima filhota e esboça um belo e emocionantíssimo discurso elogiando a loucura (“all the best people are mad”, passagem que deve ter sido abraçada calorosamente por inúmeros adolescentes que se consideram doidinhos). Alguns anos depois, após a morte da figura paternal, Alice vai a uma festa a qual era, na verdade, cerimônia na qual seria pedida em casamento – fato que a protagonista viria saber apenas no decorrer do evento. Lá, ela se vê em um dilema, pois não quer casar com seu pretendente, pois não o ama; no entanto, sua família insiste para que a protagonista se ligue pelo casamento com o aspirante a marido (alguém já não viu essa história em algum lugar?). Quando Alice é pressionada a tomar uma decisão ao ter sua mão pedida em público, ela, ao observar um coelho correndo, o segue, fugindo assim da multidão que esperava sua resposta. Ao seguir o coelho, a personagem principal cai em um buraco e, então, entra em Wonderland.

Esperava que se iniciasse, nesse momento, a parte psicodélica do filme, o tão esperado resultado da interpretação que Tim Burton daria à obra de Lewis Carrol, a explosão criativa do resultado da fecundação dessas duas tortuosas mentes. Infelizmente, todas minhas expectativas se esvaíram trágica e lentamente no decorrer da torturante obra. Burton destruiu Wonderland ao transformar esse rico universo em um lugar que abusa das tecnologias, mas carece de criatividade; os cenários eram o profundo reflexo dessa moderna carência da capacidade de criar e ousar. O mais lamentável é que a obra tinha um potencial enorme para ser exatamente o contrário do que se passou na tela.


As personagens também foram completamente lamentáveis, inclusive o esperado Mad Hatter, interpretado por Johnny Depp. Em momento nenhum eu esperava que explorassem profundamente as figuras dramáticas da obra, mas aguardava ansiosamente por inventividade e trejeitos marcantes. Todavia, as peças que solidificavam a película eram vultos acinzentados que vagavam em um quadro branco, tridimensional e caro, murmurando falas pessimamente escritas, as quais tinham a pretensão (bem sucedida) de terem suas sílabas clonadas nas cordas vocais de jovens apreciadores do mais barato – intelectualmente falando - lixo.


A Alice de Burton percorre uma aventura completamente simétrica e com um norte muito bem definido. A jovem garota deve, para salvar Wonderland, derrotar o Jaguadarte, criatura pertencente à Rainha Vermelha (o lado negro do maniqueísta universo do filme) com a Espada Vorpal, a fim de que a Rainha Branca (a face branca da maniqueísta película) tome o lugar da Rainha Vermelha. Ou seja, assim como disse um amigo meu, Alice percorre uma quest.



Um momento lamentavelmente marcante no filme é a extremamente (utilizo muito o vocábulo anterior, mas nesse momento gostaria de elevá-lo à enésima potência, tamanho é meu desprezo) digna de escárnio dança realizada por Johnny Depp, o Futterwacken. No final do filme, após voltar para o mundo real e recusar casar-se com o sujeito que havia lhe pedido a mão, Alice também reproduz o Futterwacken, no entanto, de modo extremamente (novamente gostaria de elevar o último vocábulo a enésima potência) embaraçador. Raramente sinto vergonha por terceiros, mas nesse caso foi inevitável, já que a extravagância da protagonista era ridiculamente artificial; era uma excentricidade muito bem ensaiada, polida e lustrada.


No decorrer da película, comparei a Alice... de Burton com vários filmes; a comparação que melhor demonstra meu sentimento é a entre essa obra e Labirinto(1986), de Jim Henson. No filme de 1986, a criatividade é gritante, devido às criaturas marcantes, ousadas e inventivas, e aos cenários muito bem desenhados, engenhosos e encantadores. Acredito profundamente que Burton não tentou copiar Henson, mas me arrisco a declarar que Alice no país das maravilhas é um Labirinto frustrado.


Alice no País das Maravilhas é o puro retrato da carência criativa do contemporâneo mainstream cinematográfico, uma indústria que está fodendo para o resultado artístico de suas realizações, e se preocupa somente com o resultado financeiro delas. O que está mandando na sétima arte é o dinheiro, e não a criatividade. A conseqüência da inversão dessa pirâmide é a decadência do considerado cinema-arte. Entretanto, sustentar uma película com efeitos caríssimos e não com idéias parece ser um modelo de cinema muito bem recebido pelo público; Alice no País das Maravilhas é a maior bilheteria de abertura da Walt Disney no Brasil. Não grito por um fim ao consumo do mainstream, mas por um apreço consciente.


P.S:Recentemente descobri a existência de uma versão de Alice... feita por Jan Svankmajer, um artista surrealista checo, o qual, ironicamente, influenciou Burton. Ainda não tive a oportunidade de ver sua versão, mas vi alguns vídeos dela no YouTube, e me impressionei com o trabalho, que se mostra criativo, minimalista e envolvente. Se alguém conhece essa obra, comente sua opinião acerca dela.







7 comentários:

  1. Não me decepcionei tanto quanto você, mas concordo que o início merecia ser apagado, assim como aquela ridícula dança de Johnny Depp, que está caricato ao extremo.

    Quanto a Labirinto, me traz a lembrança de minha infância, hehe, foi um dos primeiros VHS que meu pai comprou para eu ficar vendo e revendo até cansar.

    abraços

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  2. Calma! O filme não é assim tão mau, não é o esperado de Burton mas não é assim tão mau.

    Abraço e bom regresso.
    Cinema as my World

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  3. Daniel!

    Ótimo link que fez com o longa do Henson e George Lucas 'Labirinto'. Uma fita que marcou a minha infância e que esta em minha coleção!

    De fato, o 'Alice' do Burton não me animou muito e esperava muito mais do filme. Unificar as duas obras do Carrol, País das Maravilhas com o País dos Espelhos, foi muito arriscado e um tanto infeliz!

    Mas nada que atrapalhe a carreira de Burton. Na minha visão, sempre um artista único!

    Ele fez outro filme irregular como 'Planeta dos Macacos' e depois se recuperou com 'Peixe Grande'. Eu só aguardo uma autoria dele ao estilo 'Edward Mãos de tesoura' e ' O Estranho Mundo de Jack' e ou/ ' Ed Wood', nada mais de transmutações ou remakes!

    Parece que o próximo filme dele com Depp, sobre vampiros será interessante!

    Ótima resenha!
    Abs,
    Rodrigo

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  4. Tb não considero o filme tão ruim, ele tem boas cenas e diverte, mas concordo que fica abaixo de outras obras de Burton.

    A atriz que faz a Alice é muito parecida com Gwyneth Paltrow e é bem fraquinha por sinal.

    Abraço

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  5. Ainda não assisti Alice, mas Tim Burton é superestimado e chato, salvam-se rara exceções. Já a obra de Jan Svankmajer, apesar de criativa e bem trabalhada, é demasiada lenta e por vezes beirando o ridiulo do culto/intelectual, mas vale a arte visual.

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  6. Concordo completamente com o texto... eu adorei o livro quando li exatamente porque ele era uma coisa psicodélica, parece um sonho ou aquelas idéias que você tem quando é criança. O que este filme me pareceu foi mais uma crônica de "o herói salva o dia" com direito a chamar a Alice de escolhida e muitas distorções nos personagens originais. Meh...

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  7. Ótimo blog, ótimo post, ótima análise.
    Não esperava nada desse filme e ainda assim, me decepcionei.
    Não vejo e jamais vi Tim Burton como gênio.
    Se reparar bem, seus filmes sempre têm um discurso simplista e comum (vide A Noiva Cadáver, para citar apenas um), porém abordados de maneira "criativa".

    Já vi Alice de Jan Svankmajer e é, com certeza, extremamente melhor.

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